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Artigo Original, Biomed Biopharm Res., 2023; 20(2):43-57
doi: 10.19277/bbr.20.2.326; Bilingue PDF [+]; html em inglês [EN]   

 

Desenvolvimento e avaliação de eficácia de xampu sólido em barra

Laryssa Silva de Lima 1*, Giovanna Calderaro Illiceto 1*, Maria Valéria Robles Velasco 2, & Michelli Ferrera  Dario 1,2  ✉️

1 - University Center São Camilo, São Paulo, Brazil
2 - Department of Pharmacy, School of Pharmaceutical Sciences, University of São Paulo, São Paulo, Brazil 


* Estas autoras tiveram igual contributo para o desenvolvimento deste estudo.

 

Resumo

O xampu sólido é uma forma cosmética inovadora e alternativa de xampu que, por não conter água em sua composição, ganha atributo de ser mais sustentável. Este trabalho tem como objetivo desenvolver, avaliar a estabilidade e caracterizar formulação de xampu sólido. Foram preparadas nove formulações variando-se as concentrações dos tensoativos sólidos definidos por meio de um delineamento estatístico. As formulações, denominadas F1 a F9 foram submetidas à avaliação de estabilidade preliminar em diferentes condições de armazenamento por 30 dias, nos quais foram avaliadas características organolépticas assim como o valor de pH. As formulações aprovadas foram caracterizadas física e funcionalmente. Apenas duas formulações (F3 e F5) foram aprovadas na Avaliação da Estabilidade pois não apresentaram alterações na consistência, coloração, odor, aspecto e pH, nas diferentes condições de armazenamento. Essas formulações mostraram formação de espuma estável mas desmancharam muito facilmente e apresentavam baixa dureza, o que indica a necessidade de adequar a concentração dos agentes de consistência a fim de tornar a formulação mais resistente à quebra. Ademais, as formulações demonstraram excelente capacidade de limpeza e de condicionamento.

Palavras-chave: Estabilidade, cosméticos para o cabelo, cabelo, xampu, tensoativos

Como Citar: Silva de Lima, L., et al. (2023) Development and evaluation of the effectiveness of the solid shampoo bar. Biomedical and Biopharmaceutical Research, 20(2), 28-42

Correspondência autor: Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar. 
Recebido: 25/07/2023; Aceite: 07/12/2023

 

Introdução

Xampus são primariamente produtos destinados a promover a limpeza dos cabelos e couro cabeludo (remoção de óleos, partículas de pele, caspa, sujeira, poluentes ambientais e outras partículas contaminantes). Porém, além dos atributos elementares, espera-se que a formulação garanta embelezamento e parâmetros como penteabilidade e resistência mecânica (1).

Formulações de xampu são compostas, basicamente, por uma mistura de tensoativos incoporados em uma forma cosmética conveniente: líquido, sólido ou em pó. Os tensoativos são os principais ingredientes dos xampus pois, além de elevada capacidade de limpeza, formam espuma (qualidade desejada pelos consumidores) em função da carcaterística anfifílica dessas moléculas (2).

O xampu em barra é uma forma cosmética alternativa que, diferentemente do convencional (líquido), não contém água como ingrediente principal em sua formulação, tornando-o mais sustentável (3,4). Aliado à baixa quantidade de água, é esperado que o produto necessite de menor concentração de substâncias com ação conservante e isso teria um impacto positivo no meio ambiente visto que algumas moléculas, como os parabenos, são capazes de se acumular em animais marinhos e de água doce (5,6). A redução da necessidade de ingredientes conservantes também é interessante pois reduz a capacidade do produto causar dermatites de contato alérgica e outras reações alérgicas (7).

Porém, sua obtenção representa um desafio visto que a maioria dos tensoativos (agentes de limpeza e formadores de espuma) disponíveis no mercado atualmente são de consistência líquida. Os problemas frequentemente encontrados em xampus sólidos comercialmente disponíveis são: dureza na barra (plasticidade), falta de brilho, cracking (rachadura), espuma não agradável em quantidade e cremosidade, aspereza e desgaste em uso (perda de massa, amolecimento da barra) (8,9). Assim, torna-se fundamental o desenvolvimento de formulações de xampu sólido contendo ingredientes inovadores, ao mesmo tempo em que mantem os atributos desejados desta classe de cosmético. Portanto, o objetivo deste trabalho foi desenvolver, avaliar a estabilidade preliminar e caracterizar fisicamente formulações de xampu sólido em barra.

Materiais e Métodos

Desenvolvimento e preparo das formulações

A composição quantitativa das formulações (Tabela 1) foi obtida segundo um planejamento estatístico (DOE) do tipo mistura, na qual variaram-se as concentrações dos três tensoativos sólidos utilizados (cocoil isetionato de sódio, sulfato de sódio coco e lauril sulfoacetato de sódio) de modo que a soma desses ingredientes compreendesse 100% da mistura de tensoativos. O planejamento estatístico foi realizado no software R obtendo-se nove formulações.

Tabela 1 - Composição quali-quantitativa das formulações obtidas por planejamento estatístico de mistura (DOE).
bbr.20.2.326.Tab1
*INCI: International Nomenclature of Cosmetic Ingredients

 

Inicialmente foi preparada uma mistura de isetionato de sódio com cocoamidopropil betaína, que permaneceu sob aquecimento em banho-maria por aproximadamente uma hora, até haver a formação de uma pasta, como mostrado nas Figuras 1a - d. Esta etapa foi necessária pois o isetionato de sódio em flocos apresenta faixa de fusão elevada (191-194 ºC), ou seja, não seria possível incorporá-lo de modo homogêneo na formulação utilizando-se apenas aquecimento. Uma mistura previa com cocoamidopropil betaína facilita o processo. Após a mistura realizada sob aquecimento, a pasta foi triturada com auxílio de gral e pistilo a fim de garantir uma mistura ainda mais homogênea (Figura 1c).

Figura 1 - Mistura de isetionato de sódio e cocoamidopropil betaína. (a) Imagem mostra o aquecimento realizado em banho-maria. (b) Formação da pasta de isetionato de sódio e cocoamidopropil betaína. (c) Pasta de isetionato de sódio e cocoamidopropil betaína sendo triturada. (d) Pasta após a trituração.
bbr.20.2.326.Fig1

 

Posteriormente, os demais ingredientes (exceto o extrato glicólico de Jaborandi) foram incorporados à pasta de isetionato de sódio e cocoamidopropil betaína sob aquecimento. Após a mistura adquirir um aspecto homogêneo, retirou-se do aquecimento e adicionou-se o extrato glicólico de Jaborandi sob agitação manual vigorosa. A formulação foi transferida para moldes apropriados e resfriada em geladeira até a solidificação.

Avaliação de Estabilidade Preliminar

As formulações foram submetidas a condições de estresse, por 30 dias, visando acelerar o surgimento de possíveis sinais de instabilidade. As amostras foram armazenadas nas seguintes condições: temperatura ambiente (22 ± 2 ºC), aquecimento (40 ± 2 ºC) e resfriamento (5 ± 1 ºC). As amostras foram avaliadas quanto às características organolépticas (aspecto, cor e odor) e valor de pH nos tempos 0 (zero), 7, 14 e 30 dias (10). Considerou-se como tempo zero cerca de 48 horas após o preparo da formulação.

A análise das características organolépticas foi realizada visualmente. As medidas de pH foram realizadas em pH metro a partir de dispersões de 10% (p/p) das formulações de xampu sólido em água purificada.

Teste de Formação de Espuma

O ensaio para caracterização da espuma formada utilizado foi uma adaptação do Teste de Ross-Miles (11). Cerca de 1 grama do xampu, previamente ralado, foi transferido para provetas, completando com água deionizada até o nível de 50 ml. A proveta foi invertida três vezes. O nível de espuma gerado no instante inicial e após 20 minutos de repouso foi anotado. O ensaio foi realizado em triplicata.

Teste de Rachadura 

As amostras dos xampus (em triplicata) foram suspensas por um sistema onde metade ficou imersa em água deionizada dentro de um recipiente plástico por 24 horas à temperatura ambiente. Após este período, os mesmos foram retirados da água e permaneceram suspensos para secagem por 32 horas. Posteriormente, os níveis de rachaduras foram classificados em 0, I, II ou III, de acordo com a Tabela 2 (8,12).

Tabela 2 - Scale for evaluating cracks (8).
bbr.20.2.326.Tab2

 

Análise de textura

Os parâmetros de textura (consistência, dureza, coesividade e trabalho da coesão) dos xampus em barra foi realizada em modo de compressão por penetração, no texturômetro Stable Micro Systems Texture Analyzer® (Surrey, Reino Unido) utilizando a sonda SMS P/N, profundidade de penetração de 8 mm, velocidade de teste de 1 mm/s e trigger force de 0,049 N. Foram feitas 8 repetições para cada barra de xampu (em duplicata) e os testes foram realizados em temperatura ambiente (~25°C).

Teste de Limpeza de Mechas de Cabelo

Mechas de cabelo caucasiano liso natural virgem (triplicata por grupo), adquiridas comercialmente, com aproximadamente 15 cm de comprimento e massa de 2,5 g foram inicialmente pesadas, obtendo-se sua massa inicial exata. Posteriormente, estas foram mergulhadas em uma solução de sebo artificial (6% p/p) em hexano, condição que mimetiza o sebo natural humano que fica aderido à fibra capilar, após evaporação do solvente orgânico, deixando-a com a aparência de suja (13,14). O sebo artificial (Tabela 3) foi preparado por meio da simples mistura dos ingredientes após fusão.

Tabela 3 - Composição quali-quantitativa do sebo artificial.
bbr.20.2.326.Tab3
*INCI: International Nomenclature of Cosmetic Ingredients

 

As mechas permaneceram em contato com a solução de sebo artificial por 20 minutos sob agitação, com auxílio do agitador magnético. Posteriormente, o excesso de solução foi retirado manualmente, sendo deixadas em repouso por 24 horas à temperatura ambiente (22,0 ± 2,0 ºC) e umidade relativa controlada (65% UR), para secagem. Após este período, as mechas foram pesadas novamente, obtendo-se a massa que compreende a soma da mecha de cabelo e do sebo aderido.

Após o processo de secagem, as mechas foram lavadas conforme procedimento padronizado. Inicialmente, as mechas foram enxaguadas por 10 segundas em água morna a 40,0 ± 1,0 °C. Em seguida, cerca de 1,0g de xampu foi aplicado às mechas, sendo massageada por 1 minuto. Posteriormente, as mechas foram enxaguadas durante 30 segundas com água morna a 40,0 ± 1,0 ºC. O excesso de água foi retirado manualmente, e as mechas foram deixadas para secar naturalmente à temperatura ambiente (22,0 ± 2,0 ºC) durante pelo menos 48 horas (15). Após a secagem, as mechas foram pesadas, sendo obtido a soma da massa da mecha e do sebo artificial residual. Este ensaio foi realizado em triplicata. O poder de detergência foi calculado pela porcentagem de sebo removido, conforme Equação 1 (14).

bbr.20.2.326.Eq1 [Eq. 1]

 

onde: DP = poder de detergência; SR = quantidade de sebo residual presente na mecha após o procedimento de lavagem; ST= quantidade de sebo total presente na mecha antes do procedimento de lavagem.

Penteabilidade

O trabalho total para pentear a seco foi determinado no Dia-Stron® MTT 175 (Dia-Stron LTD, Hampshire, RU)à temperatura ambiente (22,0 ± 2,0 ºC) e 65% UR. As mechas de cabelo (com aproximadamente 2,5g de massa e 15cm de comprimento) foram inicialmente penteadas dez vezes usando um pente plástico para desembaraçar os fios, evitando assim danos ao equipamento. Cinco ensaios, no mínimo, foram conduzidos para cada mecha, sendo que entre cada ensaio a mecha era rotacionada 360º por cinco vezes (16). A porcentagem de variação na força necessária para pentear a seco foi calculada comparando-se os valores obtidos para a mesma mecha de cabelo, antes e após a lavagem com o xampu sólido. O ensaio foi feito em triplicata.

Análise estatística

A análise estatística foi realizada pelo teste t de Student para duas médias, exceto o teste de penteabilidade, em que empregou-se o teste t pareado, comparando os resultados obtidos antes e após a lavagem das mechas com xampu sólido. O nível de significância adotado foi α=0,05.

Resultados e discussão

Formulações de xampu são geralmente preparadas a partir de uma mistura de tensoativos aniônicos, anfotéricos e catiônicos. Os aniônicos, empregados neste trabalho (sulfato de sódio coco, cocoil isetionato de sódio e lauril sulfoacetato de sódio), possuem elevada capacidade de limpeza e formação de espuma. Sulfoacetatos (por exemplo, lauril sulfoacetato de sódio) e sulfosuccinatos (por exemplo, lauril sulfosuccinato dissódico) podem ser usados para shampoos mais suaves e “sem Lauril Éter Sulfato de Sódio (LESS)”. Isetionatos têm sido empregados para obter barras sintéticas pois são suaves para a pele e, recentemente, têm atraído muito interesse como substitutos adequados para sulfatos em xampus “sem sulfato”. Cocoamidopropil betaína é um dos tensoativos secundários anfotéricos mais utilizados em xampus, possui baixo potencial de irritação em relação aos sulfatados mas reduz a capacidade de formação de espuma proveniente dos aniônicos (17). Tensoativos catiônicos, como o cloreto de cetrimônio, atuam como agentes condicionantes, melhorando a penteabilidade e neutralizando a carga negativa estática presente na superfície da fibra a capilar (18).

As formulações preparadas a partir do delineamento experimental apresentaram aroma característico de coco, devido as diversas matérias-primas derivadas de coco presentes na mesma (cocoil isetionato de sódio, óleo de coco e sulfato de sódio coco), coloração branca e aspecto homogêneo (Figura 2).

Figura 2 - Exemplo de aspecto do xampu sólido.
bbr.20.2.326.Fig2

 

De acordo com Guia de Estabilidade de Produtos Cosméticos da ANVISA (Brasil) (10), o ensaio de estabilidade preliminar visa orientar a escolha das formulações, na etapa de desenvolvimento do produto. Assim, devido à natureza do ensaio, as formulações são expostas a condições extremas de temperatura, o que permite a antecipação de possíveis reações entre os componentes, sendo útil na etapa de triagem. Alterações no valor de pH, por exemplo, podem indicar a ocorrência de alguma reação química, incluindo degradação dos componentes presentes e oxidação (19). Informações sobre características organolépticas (aspecto, odor e cor) também são fundamentais pois evidenciam alterações químicas e físicas nos insumos utilizados.

Os valores de pH das formulações ao longo do ensaio de estabilidade nas condições de armazenamento temperatura ambiente (22 ± 2 ºC), aquecimento em estufa (40 ± 2 ºC) e resfriamento em refrigerador (5 ± 1 ºC) durante os 30 dias de estudo chegou, no máximo, a 6,6 independentemente da temperatura. O tensoativo cocoil isetionato de sódio é facilmente hidrolisável, gerando ácidos graxos e isetionato de sódio, substância que, em água, possui pH 7 a 11. Portanto, o aumento de pH observado pode ser resultado da formação de isetionato de sódio durante o armazenamento da formulação na presença de umidade (20). Os valores de pH são considerados aceitáveis pois a fibra capilar, assim como a pele, apresenta pH levemente ácido, sendo biocompatível com valores de pH entre 4,5 e 7,0 (21).

Com relação ao aspecto das formulações armazenadas à temperatura ambiente (22,0 ± 2,0 ºC), apenas as formulações F3, F5, F7 e F8 não apresentaram alterações na consistência (sólida), coloração (branca), odor (característico de coco) e aspecto (homogênea), sendo consideradas estáveis. As demais formulações apresentaram alterações de aspecto pois as superfícies tornaram-se heterogêneas. À temperatura elevada (40,0 ± 2,0 ºC), apenas as formulações F3, F4 e F5 mantiveram as características iniciais após 30 dias de ensaio. As formulações F2, F6, F7, F8 e F9 apresentaram alteração de aspecto (apresentaram superfície heterogênea), enquanto a F1 também mostrou alteração de consistência, tornando-se semissólida (pastosa). Em baixa temperatura (5,0 ± 1,0 ºC) somente a F1 não manteve as características iniciais após 30 dias de ensaio. O maior número de formulações inalteradas observado em condição de baixa temperatura pode ser explicado pela menor velocidade de reações químicas nessa condição.

Como apenas as formulações F3 e F5 mostraram-se estáveis em todas as temperaturas de armazenamento, por 30 dias, elas foram caracterizadas física e funcionalmente. Ambas as formulações possuíam as menores concentrações do tensoativo sulfato de sódio coco e elevadas proporções de cocoil isetionato de sódio e lauril sulfoacetato de sódio.

De modo geral, as formulações aprovadas nos testes de estabilidade obtiveram um bom desempenho em formar espuma, apresentando pequena variação de volume no tempo de repouso. A formulação F3 gerou 25,0 ± 4,0 ml de espuma incialmente, enquanto a F5 gerou 18,67 ± 2,31 ml. Após 20 minutos de repouso, a F3 apresentou variação de 4,07 ± 0,66% e a F5 de 2,08 ± 3,61%. Assim, a estabilidade da espuma da formulação F3 foi de 95,9 ± 0,7% enquanto a F5 de 97,9 ± 3,6%. Porém, a análise estatística revelou que as amostras não apresentaram resultados significativamente diferentes (p-valor = 0,447).

Esses resultados indicam que as formulações de xampu sólido preparadas apresentam valores de estabilidade de espuma semelhantes ou maiores que formulações de xampu líquido, sabonetes em barra ou dispersões de tensoativos líquidos (22-25). Antonic et al. (22) avaliou sabonetes em barra obtidos por meio de reações de saponificação e observou que os sabões preparados com óleo de canola ou de palma geraram sabonetes com estabilidade de espuma em torno de 70%. Uma dispersão de saponinas extraídas de Furcraea foetida apresentou estabilidade de 85% (24). Badi e Khan mostrou que as formulações de xampu líquidas avaliadas apresentaram estabilidade da espuma em torno de 100% (25).

Os resultados do teste de rachadura tem como objetivo classificar os xampus em níveis de rachaduras de 0 a III. As barras de Nível 0 não apresentam rachadura, as de nível I apresentam rachaduras com fissuras superficiais, de Nível II apresentam rachaduras com fissuras profundas e as de Nível III apresentam rachaduras mais profundas, ocasionando partição do mesmo (26). Como pode-se observar na Figura 3, não foi possível avaliar a formação de rachaduras porque as formulações desmancharam logo após serem retiradas da imersão. Esse resultado indica a necessidade de aumentar a concentração dos agentes de consistência, nomeadamente o ácido esteárico e o álcool cetoestearílico, pois sabe-se que incorporar agentes de consistência pode gerar redução de rachaduras na formulação e aumentar sua resistência.

Figura 3 - Exemplo de aspecto do xampu sólido no teste de rachadura, indicado pelo código da formulação e pela triplicata.
bbr.20.2.326.Fig3

 

Os métodos de caracterização de textura para barras de limpeza envolvem testes de penetração empregando texturômetros e sondas do tipo agulhas, cones ou arames. Assim, é possível medir parâmetros como consistência, dureza, coesividade e trabalho da coesão por meio de análise de curvas geradas pelo equipamento que relacionam tempo e força (N) (27) (Figura 4). O pico ou força máxima é considerada a medida de firmeza ou dureza da amostra, ou seja, quanto maior o valor, mais firme é a amostra. A área sob a curva nessa região positiva do gráfico indica a consistência da formulação. A força máxima observada na porção negativa do gráfico, produzida no retorno da sonda, está relacionada à coesividade da amostra, enquanto a área sob a curva na região negativa indica o trabalho da coesão (28). Neste trabalho utilizou-se uma sonda tipo agulha e os resultados da análise de textura obtidos para as amostras F3 e F5 são apresentados na Tabela 4.

Figura 4 - Curva exibida no ensaio de análise de textura.
bbr.20.2.326.Fig4

 

Tabela 4 - Caracterização física das amostras de xampu sólido em barra.
bbr.20.2.326.Tab4

 

Há poucos trabalhos publicados na literatura que apresentam resultados de análise de textura de formulações em barra, como sabonetes ou xampus. Os trabalhos existentes apresentam com mais frequência apenas dados de firmeza, em detrimento dos demais. Como não há padronização internacional dos parâmetros do teste (tipo de sonda, profundidade de penetração, velocidade do teste), os resultados obtidos neste trabalho não podem ser comparados com muitos outros. Sousa (2020) desenvolveu sabonetes em barra e obteve resultados de firmeza, utilizando os mesmos parâmetros do teste, da ordem de 40N (26). Portanto, os xampus em barra F3 e F5 apresentaram valores de dureza baixos, 1,12 ± 0,05N e 0,81 ± 0,28N, respectivamente, o que corrobora com os resultados obtidos no Teste de Rachadura. Com o pequeno número de amostras avaliadas (apenas duas foram aprovadas na avaliação de estabilidade preliminar) e de trabalhos publicados nesta área, não é possível inferir sobre o impacto de cada tensoativo nos parâmetros de textura. Assim, novos experimentos são necessários para aprofundar o entendimento nesse tipo de formulação.

Ambas as formulações analisadas apresentaram excelente potencial de limpeza das mechas de cabelo (cerca de 90%), como mostrado na Tabela 4, em comparação com dados da literatura que mostram que formulações de xampu líquido comercial apresentam capacidade de limpeza de cerca de 60% (29). A análise estatística revelou que as amostras não apresentaram resultados significativamente diferentes (p-valor = 0,521), ou seja, a diferença na composição não impactou esse parâmetro de eficácia do xampu sólido.

No teste de penteabilidade, a análise estatística revelou que tanto a F3 quanto a F5 não impactaram na penteabilidade das mechas de cabelo (Figura 5), pois os valores de trabalho total, antes e após a aplicação do xampu, não se mostraram significativamente diferentes (p valor igual a 0,142 e 0,672, respectivamente), ou seja, a diferença na composição não influênciou essa característica. Porém, notavelmente, é possível observar uma tendência na diminuição do poder condicionante da formulação F3.

Figura 5 - Trabalho total para pentear as mechas antes e após a etapa de lavagem.
bbr.20.2.326.Fig5

 

Apesar da elevada concentração de tensoativos aniônicos (cocoil isetionato de sódio, sulfato de sódio coco, lauril sulfoacetato de sódio) presentes na formulação do xampu sólido, não houve aumento significativo da força necessária para pentear. Esse resultado deve-se a presença de moléculas carregadas positivamente, como a cocoamidopropil betaína (tensoativo anfotérico que apresenta carga líquida positiva no pH da formulação) e cloreto de cetiltrimetil amônio (agente catiônico antiestático). Ambos contribuem para a neutralização das cargas negativas presentes naturalmente na fibra capilar assim como daquelas depositadas pelos tensoativos aniônicos da formulação, reduzindo, assim, o frizz e o trabalho para pentear (30). Além disso, as formulações possuem agentes hidratantes e emolientes como óleo de coco, d-pantenol e manteiga de karité que, ao lubrificarem a fibra capilar, melhoram a sua penteabilidade (31).

Conclusões

As formulações aprovadas no teste de estabilidade preliminar mostraram formação de espuma estável, excelente capacidade de limpeza e de condicionamento mas possuíam baixa dureza, o que indica a necessidade de adequar a concentração dos agentes de consistência a fim de tornar a formulação mais resistente à quebra.

Agradecimentos

Os autores agradecem a doação de matérias-primas das empresas BASF e Clariant.

Declaração sobre as contribuições do autor

MFD, MVRB, conceção e desenho do estudo; LLL, GCI, implementação experimental; LLL, GCI, MFD, análise de dados; LLL, GCI, redação, edição e revisão; LLL, GCI, tabelas e figuras; MFD, supervisão e redação final.

Conflito de Interesses

Os autores declaram que não há relações financeiras e/ou pessoais que possam representar um potencial conflito de interesses.

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